domingo, 14 de março de 2010

MOÇÃO DE REPÚDIO `A INVASÃO DE ÁREA DE FUNDO DE PASTO POR MAGISTRADO

Estou cagando e andando para a convenção internacional”
Dr. Eduardo Padilha, Juiz de Direito em Casa Nova , Bahia.

Sexta-feira, dia 5 de março de 2010, a área de fundo de pasto conhecida como Areia
Grande foi invadida por pessoas que ocupavam dois carros. A porteira de
entrada foi arrombada, tendo sido parcialmente destruída, bem como a
casa que tinha servido de moradia a José Campos Braga, conhecido como
Zé de Antero, lavrador assassinado em janeiro de 2009, em razão do
conflito fundiário instalado na região entre os moradores das
comunidades e grileiros de terra.

A INVASÃO gerou apreensão e instabilidade entre os moradores de Salina da
Brinca, Jurema, Melancia e Riacho Grande. Os moradores prestaram queixa
junto à delegacia local informando o ocorrido.

A Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais (AATR), a Comissão
Pastoral da Terra/Juazeiro (CPT), o Sindicato dos Trabalhadores nas
Empresas Agrícolas, Agroindustriais e Agropecuárias dos municípios de
Juazeiro, Curaçá, Casa Nova, Sobradinho, Sento Sé (SINTAGRO-BA), e um
representante das associações de fundo de pasto se dirigiram ao Fórum
local para informar o fato ao Juiz de Direito, Dr. Eduardo Padilha, e
pedir providências quanto ao mesmo tendo em vista à tensão gerada.

Surpreendentemente, em conversa com o magistrado, descobriram que se tratava de uma ação
orquestrada pelo próprio, em companhia do Promotor de Justiça da
comarca, Dr. Sebastião Coelho, de policiais militares, do oficial de
Justiça Alberto Rocha, conhecido como Feijão, e de Gileno de Andrade
Almeida, que o Juiz informou se tratar de seu segurança pessoal. Sobre
Gileno, cabe informar que o mesmo se identifica enquanto representante
e sócio dos grileiros.

O motivo de tal invasão, segundo o Juiz, seria a realização de nova
inspeção judicial na área. Frise-se que uma inspeção judicial havia
sido realizada no dia 19 de fevereiro de 2010, que contou com a
participação de um servidor público da Coordenação de Desenvolvimento
Agrário (CDA), da AATR, da CPT, do SINTAGRO, bem como os representantes
das Associações de Fundo de Pasto.

Como se não bastasse a invasão e a realização de um ato processual sem
comunicação ao Estado da Bahia, autor da ação discriminatória em que a
inspeção teve curso, e das associações de fundo de pasto, partes no
processo, o Juiz expulsou a CPT, o SINTRAGO e o representante das
associações, e permaneceu debatendo com a AATR, apontando o seu ponto
de vista sobre a ocupação do território tradicional. Segundo ele, a
primeira inspeção foi objeto de um “engodo, uma enganação, uma
maquiagem”, que “um circo foi armado”. Alegou que o território não
possuía ocupação humana e que a quantidade de animais encontrados,
segundo ele, menos de 50 bodes, não justificava a extensão da ocupação.
O Juiz, ainda, colocou em dúvida o trabalho realizado pela CDA que
atestou a ocorrência de grilagem de terras públicas e a ocupação
tradicional das famílias, acusando-a de estar em acordo com as
associações na suposta “enganação”.

Como contraponto, a AATR argumentou que a ocupação da área se dá sob o
regime de fundo de pasto, o que não implica a ocupação humana
permanente e que os animais são criados soltos. A AATR informou também
que há uma convenção internacional, ratificada pelo Poder Legislativo,
que assegura a proteção de tal forma de ocupação tradicional das
terras. Foi nesse momento que o magistrado desdenhou de tal instrumento
legal e disse: “Estou cagando e andando para a Convenção Internacional”.

Diante da argumentação da AATR, o juiz se reconheceu enquanto desconhecedor do
regime de fundo de pasto, por nunca ter vivido no campo, mas que, mesmo
assim, continuará sustentando o seu entendimento sobre a questão.

Repudiamos a ocorrência de um ato processual que não respeitou o devido processo
legal, por contrariar o contraditório e a ampla defesa, o menosprezo do
magistrado em relação aos instrumentos normativos de defesa de direitos
sociais e em relação à ocupação centenário das comunidades de fundo de
pasto.

Pedimos apoio na divulgação desta moção e na luta das comunidades tradicionais pela permanência em seus territórios.


Casa Nova, 11 de março de 2010.


União das Associações de Fundo de Pasto de Casa Nova (UNASF)

Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia (AATR)

Comissão Pastoral da Terra/ Diocese de Juazeiro (CPT)

SINTRAGRO-BA

Articulação do Semi-árido/Casa Nova (ASA)

Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (IRPAA)

Paróquia São José Operário – Casa Nova

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