segunda-feira, 12 de outubro de 2009

ESCLARECIMENTOS SOBRE AS ACUSAÇÕES CONTRA O MST

Diante da repercussão dos últimos episódios que envolvem o MST,
queremos esclarecer os fatos e questionar algumas "verdades" apresentadas
na mídia burguesa sobre a ocupação da fazenda grilada pela multinacional
Cutrale, no interior de São Paulo.

A ocupação

No dia 28 de setembro, cerca de 250 famílias sem terra ocuparam pela
terceira vez uma área de aproximadamente 3 mil hectares, grilada pela
empresa transnacional de sucos Cutrale. A mobilização pretendia fazer
pressão para que o governo federal agilizasse a retomada das áreas
griladas (pertencentes a União) e efetuasse o assentamento das famílias
acampadas na região.

Logo após a ocupação, os trabalhadores rurais iniciaram a organização
do acampamento. Como forma de denúncia, as famílias derrubaram cerca de 3
mil pés de laranja - que representam o grilo - para, no lugar, plantar
alimentos. Alimentos estes que poderiam ser produzidos se lá não tivessem
mais de um milhão de pés de laranja.

Se, neste momento, por conta das imagens repetidas exaustivamente e da
ausência das informações da situação da luta pela terra na região,
parte da sociedade e daqueles que sempre apoiaram nossa luta, reprovam essa
forma de protesto, afirmamos que compreendemos e que estamos a disposição
para quaisquer esclarecimentos.

Somos os primeiros e mais interessados em fazer com que as terras
agrícolas realmente produzam alimentos. No entanto, não podemos nos calar
enquanto terras públicas continuarem sendo utilizadas em benefício
privado; enquanto milhares de famílias sem terra continuarem vivendo na
beira de estradas, debaixo de lonas pretas. A produtividade da área não
pode esconder que a Cutrale grilou terras públicas. Aos olhos da
população, por mais impactantes que sejam, as imagens não podem ocultar
que uma multinacional extrai riqueza de terras griladas. Mais do que
somente esclarecer os fatos, é preciso entender a complexidade e a
dimensão da luta pela terra naquela região.

O MST está presente na região de Iaras desde 1995. Ao passo que o
enfrentamento aos latifúndios ia avançando, mais famílias se organizavam
nos acampamentos - algumas delas já acampadas há quase dez anos. Com a
confirmação de que o Complexo Monções, uma área de mais de 100 mil
hectares, é terra pública pertencente a União, uma pequena parte dele
foi destinado a Reforma Agrária e algumas famílias assentadas. Mas ainda
existem 450 famílias a espera de terra.

Por que elas não são assentadas nos outros 90 mil hectares restantes?
Será que é por que todas as áreas que ainda poderiam ser retomadas são
terras públicas que estão sendo utilizadas indevidamente por grandes
empresas multinacionais como a Cutrale?

É dever do Incra e do governo federal arrecadar terras públicas,
patrimônio do povo brasileiro, para atender as famílias sem terra, sem
que seja necessário ir ao extremo da necessidade humana em permanecer mais
de 10 anos sob lonas, na chuva, no frio, no sol forte em beiras de
estradas, para nelas produzir alimentos saudáveis e fazer cumprir a
função social prevista na Constituição.

Aliado a tudo isso, há também a forte atuação do Poder Judiciário
para emperrar o processo de Reforma Agrária. É preciso chamar a atenção
para a decisão da Justiça Federal de Ourinhos (SP) que, em agosto,
decretou a extinção do processo em que o Incra reclama a fazenda como
terra pública. A Justiça alegou que o Incra, órgão federal responsável
pela execução da Reforma Agrária, é ilegítimo para reivindicar a
área. Quem poderá fazê-lo então?

Esperamos que essa decisão judicial, um exemplo dos entraves existentes
para impedir o avanço da Reforma Agrária em nosso país, seja revertida
nas instâncias superiores do Poder Judiciário. Queremos saber por que uma
fazenda grilada não pode ser destinada a Reforma Agrária?

A depredação da fazenda

Repudiamos a versão construída para responsabilizar o MST pela
depredação da fazenda. Admitimos que, assim como derrubamos pés de
laranja, fizemos algumas pichações para deixar registrado o nosso
protesto contra a grilagem da área. Porém, estamos sofrendo acusações e
queremos esclarecer que:

Destruição e roubo das casas: logo após a ocupação, em acordo com os
trabalhadores que moram na fazenda, as casas foram desocupadas e trancadas.
Mais tarde, alguns deles decidiram retirar seus pertences de dentro da
área. Em todas as nossas ocupações sempre respeitamos os trabalhadores e
zelamos por sua segurança.

Depredação de tratores: uma empresa com esse porte possui oficina
mecânica dentro das fazendas e, portanto, faz a manutenção das suas
máquinas dentro da própria área. As imagens mostram tratores e peças
que já estavam abandonadas e desmontadas antes das famílias chegarem lá.
Quem tem que responder pelo estado dos equipamentos é a Cutrale e não o
MST.

Roubo de combustíveis e venenos: como seria possível as famílias
furtarem 15 mil litros de combustíveis e toneladas de veneno sendo
escoltadas pela PM e transportadas em cima de uma carroceria de caminhão?

Essas acusações são infundadas. Como tudo isso poderia ter sido feito
por famílias que estiveram o tempo todo cercadas pelas tropas da Policia
Militar, sempre munida de câmeras filmadoras, com apoio de helicópteros e
que no despejo foram colocadas em cima de dois caminhões da própria
multinacional Cutrale?

Não cometemos aqueles atos de vandalismos e exigimos que os mesmo sejam
identificados e punidos. Se às vezes acontecem excessos isolados em nossas
ocupações, buscamos avaliá-los e corrigi-los. Diante do conflito
estabelecido na hora do despejo, os integrantes do MST não puderam
acompanhar a entrada da PM na fazenda após a desocupação. O que
realmente aconteceu após a saída das famílias acampadas?

Por que tendo recebido imagens da destruição dos pés de laranja ainda
no dia 28 de setembro, somente no dia 5 de outubro a Rede Globo resolveu
exibi-las e fazer de forma tão apelativa?

Os representantes do agronegócio e a bancada ruralista precisavam de
algum argumento que justificasse mais uma tentativa de instalação de uma
nova CPI contra o MST. Com isso, a verdadeira intenção, é inviabilizar a
atuação de um movimento social que há 25 anos luta pela terra no Brasil.

Convidamos toda a sociedade, cidadãos e cidadãs brasileiros, autoridades
e parlamentes, para visitar a região, a área ocupada, conversar com as
famílias acampadas e tirar as suas conclusões.

São Paulo, 9 de outubro de 2009.

MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA
DIREÇÃO ESTADUAL/ SP

--
Camila Bonassa
MST/SP
(11) 3663-1064/(11) 8488-6533

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