terça-feira, 20 de outubro de 2009

Confronto entre facções ocorre há pelo menos 6 meses

Disputas entre traficantes do morro de São João e do Macaco e em outras áreas cidade não tiveram intervenção policial. Imprensa só repercute casos em que são vitimadas pessoas de fora das favelas
Por: Anselmo Massad


O confronto entre traficantes do Comando Vermelho, que controlam o tráfico no Morro São João, e da Amigos dos Amigos (ADA), do Morro do Macaco, estendem-se há pelo menos seis meses, diz Maurício Campos, integrante da Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência. Apesar disso, o caso ganha destaque apenas após a derrubada de um helicóptero da Polícia Militar, em meio a confronto que deixou 17 mortos no fim de semana.

"O confronto acontece há alguns meses com a polícia se mantendo omissa", critica Campos. "A disputa de facções entre os morros de São João e do Macaco só ganha essa proporção agora por causa do helicóptero (abatido por traficantes)", explica. Há relatos de pelo menos duas tentativas de invasão ao Morro do Macaco e pelo menos uma ao Morro de São João nos últimos seis meses.

O ativista sustenta que, em áreas como a Vila Vintém, na zona oeste da cidade, uma disputa entre divisões da ADA e o Terceiro Comando deixaram pelo menos 30 mortos sem que houvesse interferência policial nem grande cobertura da imprensa. "São fatos que vem se agravando", afirma.

Para Campos, a volta dos confrontos entre facções criminosas em favelas do Rio de Janeiro são decorrência de uma opção estratégica equivocada da política de segurança do estado. Quando assumiu o cargo, o secretário de Segurança Público, José Mariano Beltrame, adotou como prioridade a desarticulação do Comando Vermelho, o maior dos agrupamentos criminosos. Essa escolha foi um dos motivos para a megaoperação no Complexo do Alemão em 2007, quando 1.300 policiais ocuparam a região, deixando 44 mortos.

"Essa opção levou a um desequilíbrio no tráfico, que estimula ataques de outras facções", avalia. Para ele, em favelas da zona sul – como Pavão, Cantagalo e Babilônia – esse tipo de confronto voltou a aparecer. "Longe de tirar a capacidade de se lançarem contra as outras facções, essa opção aumentou o problema. E quem sofre é a população (que mora em favelas)", sustenta.

Polícia como facção


"Em eventos em que há mortes de oficiais, especialmente os de grande repercussão midiática, é prática policial não só do Rio, mas de todo o país, promover uma retaliação indiscriminada, com multiplicação de execuções sumárias", lamenta Campos. "O problema é que isso atinge a população como um todo", completa.

Um exemplo disso é o fato de que todas as vítimas não-policiais do confronto são imediatamente taxadas de traficantes, discurso incorporado por Beltrame e por parte da imprensa. Segundo Campos, pelo menos três moradores foram mortos pelos traficantes aparentemente confundidos com membros da facção rival. A polícia recusou os apelos de familiares para que os corpos fossem recolhidos.

Fora do Rio de Janeiro, o caso mais conhecido em que esse tipo de atitude foi adotada foram os crimes de maio de 2006 em São Paulo, quando, após uma onda de ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC), foram pelo menos 493 mortos pela polícia em casos registrados como autos de resistência. O instrumento é usado, segundo organizações de direitos humanos, como forma de mascarar execuções sumárias.

"Pela lei, a reação da força policial deveria ser investigar e prender os responsáveis", reitera. "Após a queda do helicóptero, houve uma chamada geral a policiais para ocuparem outras comunidades, sob a justificativa de que iriam frustrar novas tentativas de invasão. Isso é um pretexto para retaliar as facções envolvidas", acusa.

Segundo Campos, os policiais foram deslocados para favelas como a do Jacarezinho e Manguinhos, onde o Comando Vermelho controla o tráfico, bem como a Rocinha e o morro de São Carlos, dominados pela ADA. "A polícia responde como se fosse uma facção envolvida na disputa (por território)", critica.

A ação do secretário Beltrame é omissa e até legitima o comportamento dos policiais por não criticar a reação tomada pelo comando da PM, segundo o ativista.

Entidades de defesa de direitos humanos defendem que a política de segurança não poderia ser baseada no combate ao tráfico em comunidades pobres, mas aos segmentos responsáveis pelo fluxo internacional de drogas.

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